Entrevista à Santa Casa da Misericórdia do Louriçal
A Gescar está a desenvolver um ciclo de entrevistas dedicado à comunidade pretendendo, desta forma, dar o seu pequeno contributo para a maior divulgação de várias organizações e instituições que contribuem decisivamente para o bem-estar comum.
Para dar continuidade a este projeto, hoje vamos entrevistar um dos nossos clientes que dispensa grandes apresentações, que há muitos anos tem marcado a vida solidária do concelho de Pombal, a Santa Casa da Misericórdia do Louriçal.
Apresentação do Convidado
A Irmandade da Misericórdia do Louriçal, também denominada Santa Casa da Misericórdia do Louriçal é uma Instituição Particular de Solidariedade Social. Fundada no séc. XVIII, segundo os registos existentes, mas foi em 1995 que a sua atividade teve um impulso maior, junto dos mais idosos e desfavorecidos. Surgiu, então, a resposta social Serviço de Apoio Domiciliário, com capacidade para 42 utentes.
Tem por objetivo o desenvolvimento e a prestação de serviços na área social, nomeadamente junto da população idosa.
Sentindo necessidade de dar uma resposta mais adequada e eficiente à população, bem como responder ao número crescentes de situações de isolamento, ausência de apoio familiar, ao aumento da esperança de vida e, consequentemente, maior número de idosos dependentes e grandes dependentes, a Santa Casa avançou com a construção de um Lar para idosos, bem como, deu também início à resposta social Centro de Dia.
A funcionar desde 1998, o Lar de idosos conta com uma capacidade para 45 utentes e o Centro de Dia para 30 utentes.
Oferece ainda outros serviços para a terceira idade como animação sociocultural, fisioterapia e psicologia.
Connosco temos a Drª Mafalda, Diretora Técnica da Misericórdia do Louriçal, a quem desde já agradecemos por ter aceitado o nosso convite.
Perguntas
Para iniciar gostaria de lhe perguntar como define o trabalho da Instituição e de que forma este impacta com a comunidade?
A Santa Casa da Misericórdia do Louriçal é das Instituições que mais emprega na freguesia do Louriçal. E, por outro lado, como somos a única IPSS que existe e que atua ao nível da 3ª idade, consideramos que trazemos uma mais valia à comunidade, principalmente aos nossos idosos e às suas famílias.
Damos resposta a um grande número de pedidos e necessidades que, de outro modo, dificilmente poderiam ser satisfeitas.
É do conhecimento geral, as extensas filas de espera para a admissão nestas instituições. Na sua opinião, que soluções deveriam ser adotadas para mitigar este problema?
No nosso caso, a primeira ideia que nos vem à cabeça, no que diz respeito a soluções a serem adotadas, é o alargamento do lar e o aumento do número de camas disponíveis, tendo em conta que temos 90 pessoas em fila de espera.
Considero que, no futuro, as instituições têm que apostar mais em serviços de apoio domiciliário e centro de dia. Ou seja, deveria existir um serviço de apoio domiciliário mais extenso e individualizado, embora não tenhamos só os serviços mais básicos, mas mesmo assim considero pouco. Se a família estiver em casa, que é aquilo que se preconiza, com o nosso serviço mais alargado não iria ser necessário, em muitas das situações que temos aqui, recorrer à institucionalização. Ao nível do SAD, terá que ser uma grande aposta no futuro.
Assim, para existir essa aposta são necessários mais apoios à Instituição, porque será preciso mais pessoal e, consequentemente, mais ordenados e material, e tudo isto acarreta grandes custos, de forma que teria que haver mais investimento.
Quais as principais dificuldades que identifica no quotidiano do funcionamento da Instituição?
Neste momento, uma das grandes dificuldades que as instituições estão a enfrentar é ao nível do recrutamento de pessoal, visto que não existem pessoas para trabalhar. Sendo que, os que entram muitas das vezes estão apenas alguns dias e acabam por ir embora, e não têm qualquer conhecimento ou formação na área. Esta é de facto a maior dificuldade que enfrentamos atualmente.
Aliás, o facto de estarmos localizados num meio rural, numa freguesia mais distante dos centros urbanos, a maioria das pessoas não se deslocam 20/30km para ir trabalhar.
Sendo que, por outro lado, os ordenados são baixos, o tipo de trabalho não é fácil, é muito exigente a nível físico e psicológico e as tabelas têm valores muito baixos.
Adicionalmente a tudo isto, o tipo de utentes que temos hoje são cada vez mais exigentes, principalmente ao nível da alimentação e dos cuidados.
Assim, é necessário repensar na filosofia do lar em si, porque acordar todos na mesma altura e comerem todos à mesma hora, já começa a não acontecer. Essa linha vai ter que ser repensada no futuro.
Está muito em voga o conceito do investidor social onde empresas assumem o papel de parceiros no desenvolvimento de projetos de cariz social, geralmente, com contrapartidas de natureza fiscal. Como vê este modelo de parceria?
Considero um conceito bastante interessante, vemos que as empresas estão a focar-se, cada vez mais, nas áreas da responsabilidade social. Seja com apoios ou financiamentos, acaba por ser um benefício mútuo porque damos visibilidade às empresas e elas dão-nos o mesmo a nós. Portanto, considero uma parceria bastante atrativa que no futuro vai trazer mais valia a todos.
Já tivemos empresas que nos apoiaram, em termos de visibilidade, na divulgação das nossas atividades e naquilo que fazemos. E, este tipo de ações, é muito positivo e essencial, sendo que, outrora as instituições estavam de tal maneira fechadas em si que ninguém sabia o que fazíamos ou qual era o nosso trabalho. E, hoje em dia, a divulgação também é bastante importante.
As doações e donativos são significativos ou estão a cair em desuso? E, de que forma as pessoas podem ajudar/apoiar a Instituição?
Estão a cair em desuso e aquelas que existiram foram muito pontuais, isto é, houve pessoas a doar a sua casa ou um bem, embora isso acontecesse de forma muito esporádica.
O mais importante é que, quando criamos um projeto e o divulgamos, as pessoas efetivamente apoiam esse projeto.
A Instituição conta com muitos voluntários? Como funciona a captação dos mesmos?
Não temos uma estrutura montada para esse efeito, mas quem vier é sempre bem-vindo. Temos um grupo de voluntárias que vem cá 1 vez por mês rezar o terço e realizar atividades com os idosos. E, temos outro grupo de voluntários mais pontuais para as atividades específicas do verão ou do natal.
É frequente ouvir-se dizer que as entidades da economia social são pagas pela Segurança Social para fazer caridade. Quer explicar-nos melhor como se desenrola este processo? Sabemos também que a Segurança Social participa com um determinado montante, mas mesmo assim as instituições são obrigadas a cobrar uma parte ao utente. A questão que se coloca é se esses dois valores somados são suficientes para dar sustentabilidade à Instituição?
Não, quem está nesta área sabe bem que não é suficiente até porque a filosofia deste tipo de Instituições, em particular, das Misericórdias é apoiar os mais desfavorecidos. Ora, sabemos que os mais desfavorecidos não têm reformas nem sequer meios para pagar que seja 1/3 da média de custo de um idoso em lar. Se, por um lado, temos o dever de apoiar estas pessoas, por outro lado, se não tivermos alguém que possa de alguma forma contribuir com valores mais altos, tudo isto fica muito limitado em termos de orçamentos, atividades, ou seja, afeta tudo aquilo em que possamos querer investir. No fundo, tem que haver alguém com maiores rendimentos para contrabalançar com alguém com menos possibilidades, no entanto, o orçamento é sempre limitado.
No entanto, não lhe chamemos fazer caridade, a nossa atuação não pode ser ao nível da caridade, somos profissionais, exercemos uma profissão, temos responsabilidades, trata-se de um trabalho estruturado que desenvolvemos aqui na freguesia. Neste caso, a palavra caridade não se aplica.
Temos que ter uma boa gestão do dinheiro. No fundo, como não há donativos é da nossa própria capacidade de gestão e orientação que depende a nossa sustentabilidade.
Atualmente, quais são os planos futuros da Instituição? Há algum projeto ou ação que a IPSS esteja a planear ou que já esteja em curso?
Desde há uns tempos para cá, quando surgiu a questão do PRR (Plano de Recuperação e Resiliência), avançámos com a candidatura ao alargamento do lar, uma vez que temos espaço para isso, o qual está em stand by. Sendo que, não está fora de questão, mas também não avançámos porque eram necessários muitos itens e especificidades e não conseguimos reunir, junto dos projetos de especialização e arquitetura, em tempo útil tudo o que era necessário.
Se tivesse oportunidade de gerir a pasta da Solidariedade Social com orçamento ilimitado, quais as medidas prioritárias que tomaria?
Seria fundamental adotar duas medidas. A primeira, seria o aumento do número de camas, o país está a envelhecer e não há qualquer resposta, temos mais pessoas em lista de espera do que aquelas que temos cá efetivamente. E, em segundo, alargaria o serviço de apoio domiciliário aos idosos, seria importante investir mais nessa área de modo a que não houvesse tanto pedido de internamento e institucionalização.
Qual a mensagem que gostaria de transmitir às pessoas e empresas da comunidade?
A Santa Casa da Misericórdia do Louriçal desenvolve um ótimo trabalho, é uma instituição de referência ao nível do concelho.
Os apoios que recebemos são sempre bem-vindos, nós, sempre que possível, também apoiamos a comunidade. É uma relação de reciprocidade.
Estamos no mercado há muitos anos e, neste momento, temos pessoas a pedir-nos apoio, que na época em que a Santa Casa abriu portas, vinham pedir apoio para familiares. Uma 2ª e 3ª geração de pessoas.
É evidente que os idosos e as suas famílias estão cada vez mais exigentes, sendo que, nem sempre o nosso entendimento vai ao encontro do entendimento da família e temos que saber gerir essas situações. O tipo de utente mudou, e a instituição tem que se readaptar e tentar ir ao encontro das necessidades de cada um.